Renata Da Silva Feliciano


DIFERENÇA ENTRE AVALIAÇÃO E EXAME NO ENSINO DE HISTÓRIA ATRAVÉS DE UMA ABORDAGEM INCLUSIVA


Introdução

Devemos entender que no processo de educação e aprendizagem somos todos responsáveis, assim como o funcionamento de um corpo. A comunidade escolar será como cabeça, tronco e membros, que precisão trabalhar juntos. Nesse processo de aprendizagem, a avaliação tem um papel muito importante.

O ensino de história assume também nesse processo um papel de destaque na construção de um pensamento histórico que, por sua vez, é um pensamento crítico, capaz de fazer o aluno duvidar e questionar discursos, lugares e pessoas. Todos esses elementos são partes da construção de uma cidadania, de acordo com Cerri, 2010.

Nos anos que seguiram, os alunos de inclusão foram chegando às salas de aula e provocaram mudanças na forma de ver, entender e de trabalhar com eles. Ratificamos que inclusão é também integração de outros alunos que não possuem laudo. Alguns autores afirmam que:

“Inclusão não se refere somente às crianças com deficiência e sim a todas as crianças, jovens e adultos que sofrem qualquer tipo de exclusão educacional, seja dentro das escolas e sala de aula quando não encontram oportunidades para participar de todas as atividades escolares, quando são expulsos e suspensos, por razões muitas vezes obscuras, quando não tem acesso a escolarização e permanecem fora das escolas” (FERREIRA, 2005).

Respeitando essas necessidades e habilidades únicas, é que propomos uma análise a partir desta pesquisa para que possamos identificar e diferenciar meios de mensurar o conhecimento de alunos de inclusão no ensino de História.

Atualmente os processos de avaliação na educação inclusiva no ensino fundamental precisam ser repensados. Uma vez definido que tipo de conhecimento será enfocado. Por quê? Para que? Aonde se quer chegar com isso? Devemos pensar em um método diferente de ensino – metodologia - e, sobretudo avaliação.

Não defenderemos a promoção direta do aluno, pois deixaríamos de analisar as habilidades que os educandos desenvolveram, os conhecimentos que puderam construir e as necessidades que eles apresentam para aprender, efetivamente. Buscaremos outra forma de avaliar, além das notas e conceitos que não selecione ou classifique, evitando evasão e comprometimento da autoestima.




O ensino de história e a educação inclusiva

De acordo com a Base Nacional Comum Curricular, prevista na Constituição de 1988, na LDB de 1996 e no Plano Nacional de Educação de 2014 vigente temos o direito a uma formação humana integral baseada nos princípios éticos, políticos e estéticos para a construção de uma sociedade justa, democrática e inclusiva.

De acordo com a Declaração de Salamanca que ocorreu no ano de 1994, “o princípio fundamental da escola inclusiva consiste em que todas as pessoas devem aprender juntas, onde quer que isto seja possível, não importam quais as dificuldades ou diferenças que possam ter”, porém, para que um trabalho pedagógico possa ofertar aprendizado de um grupo são necessários planejamentos e metodologias diferentes para que a singularidade de cada um seja respeitada. A escola inclusiva desenvolve as habilidades e competências dos alunos, além de tratar as diversidades independentes do desenvolvimento físico, emocional, cognitivo esperado ou não para a faixa etária.

Em uma escola com tendência pedagógica tradicional em que sua estrutura é baseada na premissa que os alunos aprendem algo pronto do mesmo modo, para que ocorra a inclusão é necessário adaptações, como profissionais capacitados e uma comunidade escola disposta.

A oferta da disciplina história dentre tantos fundamentos, serve para proporcionar a percepção de que existe uma grande diversidade de sujeitos e histórias, estimular o pensamento crítico e a autonomia, para que todos os alunos se reconheçam como um sujeito da sua própria história inserido no contexto escolar. E como auxiliar a construção desse pensamento crítico e lidar com sua autonomia? Como um aluno geralmente rotulado pelo seu laudo pode se sentir incluído?

Para tentar elucidar as inquietações acima e dar sentido ao diálogo entre  avaliação nos processos de ensino aprendizagem, citamos Luckesi ao afirmar que “...o ato de avaliar implica dois processos articulados e indissociáveis: diagnosticar e decidir. (...) sem o ato de decidir, o ato de avaliar não se completa”. Ou seja, é preciso então decidir! E nesse momento de decisão se abre muitas possibilidades de intervenção do professor de forma coerente com os conteúdos e objetivos que se quer atingir. E a avaliação é necessária para que se possa refletir, questionar e transformar as ações empregadas em desacordo com os objetivos.

Almejamos que os alunos durante as aulas de História sejam encorajados a problematizarem assuntos, auxiliando sua formação crítica e nos questionamentos das fontes; confirmem a veracidade das informações encontradas, favorecendo a percepção de recursos complementares, ou seja, facilitar a percepção de um tema histórico. Assim, poderão transformar informação em conhecimento e poderão agir como cidadãos críticos, levando o que aprenderam para além dos muros da escola. 

Avaliar a aprendizagem do aluno em relação aos conteúdos selecionados e ensinados não é o único sentido possível da avaliação escolar e não se esgota em si mesmo, pois “avaliar a aprendizagem do aluno é também avaliar a intervenção do professor, já que o ensino deve ser planejado e replanejado em função das aprendizagens conquistadas ou não”. (WEISZ, com SANCHES, 2006).

Ao mesmo tempo em que verifica a aprendizagem do aluno, a avaliação fornece subsídios para o fazer docente, direcionando o esforço empreendido no processo de ensino aprendizagem de forma a contemplar a abordagem pedagógica mais pertinente, adequado à disciplina, no caso História.

A diferença entre avaliar e examinar

Ao abordar de forma mais específica a avaliação que envolve a “pedagogia do exame” e a “avaliação da aprendizagem” sabemos que se trata de um tema muito polêmico e não temos a intenção de defender uma teoria específica, mas sim propor a reflexão.  

De acordo com Luckesi, a avaliação deveria ocorrer através de atitudes acolhedoras que permitiriam o sujeito a viver a aprendizagem de forma plena e dinâmica, transformando as informações em conhecimento. O acolhimento não tem características julgadoras, sim de incluir o educando, pelos meios variados e mais adequados.

“Defino a avaliação da aprendizagem como um ato amoroso no sentido de que a avaliação, por si, é um ato acolhedor, integrativo, inclusivo. Para compreender isso, importa distinguir avaliação de julgamento. O julgamento é um ato que distingue o certo do errado, incluindo o primeiro e excluindo o segundo. A avaliação tem por base acolher uma situação, para, então (e só então), ajuizar a sua qualidade, tendo em vista dar-lhe suporte de mudança, se necessário. A avaliação, como ato diagnóstico, tem por objetivo a inclusão e não a exclusão; a inclusão e não a seleção - que obrigatoriamente conduz à exclusão”. (LUCKESI, 2000)

No contexto das dificuldades encontradas quando a avaliação não é aplicada de uma forma adequada, citamos Philippe Perrenoud (1999) que defende que na prática da avaliação da aprendizagem não só se classificam os alunos na sala de aula, porém, estas práticas possuem um efeito social muito definido: a avaliação cria as hierarquias sociais que consolidam a sociedade atual, gerando exclusão.

E o que dizer sobre os alunos de inclusão? Será que os alunos que precisam de uma intervenção e avaliação diferenciadas são atendidos em sua totalidade, ou são negligenciados. Reconhecemos que as implantações de políticas de integração e educação inclusão no país geraram garantia de acesso, implantação de atendimento educacional especializado nas redes municipais, obtenção de recursos pedagógicos e tecnologias, sobretudo nas últimas décadas. Analisamos que mesmo após tudo que já foi feito na questão da inclusão ainda precisamos melhorar para que os alunos não fiquem a mercê de um atendimento ruim ou até mesmo esquecidos. E esse esquecimento a qual nos referimos é sobre sua presença viva na sala de aula, consultório e atendimento especializado
Essa ideia nos faz refletir sobre o que Vygotsky diz sobre a avaliação das pessoas com deficiência, pois é importante sabermos qual a deficiência ou limitação que a pessoa tem, porém o mais importante é sabermos sobre a pessoa que tem deficiência.

“Para nos é importante conhecer não somente que defeito tem sido medido com exatidão numa dada criança como foi afetada, senão que criança tem um dado defeito. Interessa saber que lugar ocupa a deficiência no sistema da personalidade, que tipo de reorganização tem lugar, como a criança domina sua deficiência.” (VYGOTSKY, 2006).

Podemos evitar que aluno seja tratado apenas pela sua condição baseada no laudo medico. Devemos considerar sua individualidade e particularidade para que as avaliações sejam feitas de forma única para cada aluno, não somente porque está garantido na lei, mas porque um aluno que tem um laudo de autismo, por exemplo, não seja rotulado e submetido a atividades restritas, repetitivas ou estereotipadas.

O posicionamento clínico e pedagógico é muito importante, mas não deveriam ser considerados decisivos, o contexto social e as situações de aprendizagem devem ser levados em consideração.

Ao refletirmos sobre distinguir os atos de examinar e avaliar, não significa condenar qualquer um deles como algo inadequado. Os exames são favoráveis em situações seletivas, como concursos seletivos, mas não servem para o processo da aprendizagem.

“Num concurso, os seus administradores desejam obter uma configuração da capacidade atual de desempenho do candidato; não lhes interessa o processo. Isso ocorre em qualquer situação de exame. Assim sendo, importa observar que, quando estamos trabalhando com ensino-aprendizagem (na sala de aulas, por exemplo), a avaliação é o recurso básico; mas, quando estamos selecionando candidatos ou profissionais para alguma atividade, os exames é que são úteis. A diferença é de que, do ponto de vista da avaliação, os dados revelados por esses instrumentos serão interpretados diagnosticamente, e, do ponto de vista dos concursos, serão interpretados classificatoriamente.” (LUCKESE, 2000).

Ratificamos que uma avaliação diferenciada é garantida por lei para alguns casos e que deve ser feita de maneira responsável e correta, sem valorizar somente os instrumentos, mas sim considerando a tendência pedagógica da escola, particularidades do currículo e o conteúdo programático.

Trazemos para a discussão outra abordagem inclusiva nesse contexto da avaliação adaptada: a correção. Sabemos que a avaliação é a leitura que o professor faz do que o aluno conhece baseado nas respostas que esse fornece um uma prova ou teste, e que pode ser comparado a alguns padrões já estabelecido e é importante para o aluno saber sobre seu progresso.

“O feedback é importante para o processo de ensino aprendizagem, sendo que a maneira e a forma de avaliação constituem peças importantes na motivação do aluno. Nesse contexto, o feedback que o professor fornece deveria possibilitar ao estudante reconhecer os erros não como fracasso, mas como algo que pode ser trabalhado e melhorado, favorecendo seu crescimento pessoal e social. Este tipo de avaliação auxiliaria o aluno a adquirir sua própria concepção do mundo, por meio da consciência daquilo que foi aprendido. Para tanto, deveria levar em conta, além do conteúdo trabalhado, as aprendizagens que se deram fora do contexto escolar e o contexto social no qual o aluno está inserido.” (BZUNECK, 2001).

Não devemos nos sentir profissionais ruins por não praticarmos a avaliação ideal desde o início de nossa vida no magistério, uma vez que todos nós já estivemos na sala de aula como alunos e fomos submetidos a provas e testes, e talvez fomos cobrados e ameaçados: “Cuidado como as provas!”. Por termos vivido constantemente essa ação, aprendemos inconscientemente esse modo de ser, e como professores reproduzimos em nossa prática. Quantas vezes almejando um controle dos alunos a prova foi um meio de controle? Só temos que refletir que se continuarmos agir desse modo não estaremos avaliando, e sim, examinando.


Considerações Finais

Um projeto pedagógico que sustenta uma prática de avaliação deveria ter em sua fundamentação que o ser humano é um ser em desenvolvimento, em construção permanente, porque a avaliação é um ato de obtenção de resultados e espera-se o mais satisfatório possível, dessa forma podemos dizer que é um processo de construção, articulado com um projeto pedagógico.

Quanto ao ato de examinar e avaliar, não quer dizer que algum deles seja certo ou errado, porém esse deve ser apropriado ao momento. Os exames, por exemplo, devem ser aplicados nos concursos seletivos e não no processo de aprendizagem, pois os exames operam sob a perspectiva do desempenho final, e não sobre o processo de aprendizagem.  Desse modo, quando estamos trabalhando com ensino aprendizagem a avaliação é o instrumento adequado, enquanto numa seleção de candidatos ou profissionais, os exames é que são úteis. Os dados obtidos através da avaliação serão interpretados de forma diagnosticamente, e os exames, classificatórios.
        
Os maiores desafios da avaliação na vida escolar é o olhar diferenciado a respeito da especificidade de cada sujeito histórico, o repensar sobre as práticas pedagógicas em sala de aula, e assumirmos nosso papel, todos da comunidade escolar, responsáveis pelas mudanças necessárias para vencermos os desafios de estarmos à frente de uma educação de inclusão.


Referências
Renata da Silva Feliciano é professora da rede privada e pós graduada em Educação Inclusiva e Especial (AVM/UCM) e Ensino de História (CPII).

BRASIL. Presidência da Republica. Lei n° 9394/1996: estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Brasília, 1996.

______. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais. Brasília: MEC/SEF, 1997.

______. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Parâmetros curriculares nacionais: ensino médio. Brasília: MEC; 1999.

BZUNECK, J. A. O esforço nas aprendizagens escolares: mais que um problema motivacional do aluno. Revista Educação e Ensino – USF, 2001.

CERRI, Luís Fernando. Saberes históricos diante da avaliação do ensino: notas sobre os conteúdos de história nas provas do Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM. In: Revista Brasileira de História, volume 24, nª 48, São Paulo, 2004.

Ferreira, Windyz Brazão. Educação inclusiva: será que sou a favor ou contra uma escola de qualidade para todos? In: Inclusão. Revista da Educação Especial. Secretaria de Educação Especial. V. 1, n.1 (out. 2005). Brasília: Secretaria de Educação Especial, 2005.p. 40-46.

LUCKESI, Cipriano Carlos. O que é mesmo o ato de avaliar a aprendizagem? Revista Pátio, ano 3, nº 12, pág. 6-11, fevereiro/abril 2000.


__________   Avaliação da aprendizagem escolar. São Paulo: Cortez, 2000.

___________ Avaliação da aprendizagem na escola e a questão das representações sociais. Eccos Revista Científica, vol. 4, fac. 02, Universidade Nove de Julho, São Paulo, 2002.


PERRENOUD, P. Avaliação: da excelência à regulação das aprendizagens, entre duas lógicas. Porto Alegre: Artmed, 1999.

UNESCO. Declaração de Salamanca. Sobre Princípios, Políticas e Práticas na Área das Necessidades Educativas Especiais. Disponível em: portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/salamanca.pdf.  Acesso em: 23 fevereiro 2019.

WEISZ, T.; SANCHESZ A. O diálogo entre o ensino e aprendizagem. 2.ed. São Paulo: Ática, 2006.

VYGOTSKY, L. S. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. Tradução de Maria da Penha Villalobos. 10 ed. Ícone. São Paulo, 2006.


Um comentário:

  1. Olá, acredito, salvo melhor juízo que nossos professores possuem grande autonomia no processo avaliativo, como você pensa estratégias mais próximas das realidades docentes e da necessidade de se criarem modelos avaliativos processuais? parabéns pela discussão.

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