“PERTURBADO PELA IGNORÂNCIA DA
NOSSA HISTÓRIA”: AS EXPERIÊNCIAS DE BENEDICTO MONTEIRO PARA A CONSTRUÇÃO DE UMA
HISTÓRIA REGIONAL NO LIVRO HISTÓRIA DO
PARÁ (2006)
Introdução
Em tempos de reformas curriculares que
visam um currículo nacional, como a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), e
uma prova de seleção para a entrada no ensino superior comum a todo o Brasil,
como o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), torna-se importante discutir o
lugar no regional no ensino de História. Sabe-se que o ensino de História
construído no Brasil priorizou em sua narrativa os personagens e eventos
ligados ao eixo Rio-São Paulo, deixando em segundo plano as outras regiões,
como a Amazônia. Marcos Lobato Martins ressalta que ainda hoje, nos livros
didáticos empregados no ensino fundamental e médio, a trajetória republicana
brasileira, por exemplo, é examinada à luz do “modelo paulista”. (MARTINS,
2010, p. 142).
Nesse contexto, cabe examinarmos algumas
iniciativas de valorização de uma história tida como regional. No Pará, por
exemplo, por muito tempo existiu uma disciplina denominada História do Pará ou
Estudos Paraenses, adotada pela Secretaria de Educação do Pará (SEDUC) e pela
Secretaria Municipal de Educação de Belém (SEMEC). Em 1999 foi instituída pela
SEDUC, num caráter mais interdisciplinar, a disciplina Estudos Amazônicos, que
pode ser ministrada por licenciados em Geografia, ou Ciências Sociais ou
História
em
turmas do 6º ao 9º ano do ensino fundamental ou 2º ano do Ensino Médio.
(TEIXEIRA JÚNIOR, 2016, p. 15).
Um dos livros adquiridos pela SEDUC em
grande quantidade para distribuição nas escolas com o objetivo de estimular um
ensino mais voltado para o regional foi o livro História do Pará, de Benedicto Monteiro, publicado em 2006 pela
editora Amazônia. Esta obra possui uma trajetória singular, pois não foi
inicialmente produzida com fins didáticos, mas foi apropriada pelo governo
paraense e distribuído nas escolas públicas, sendo facilmente encontrado nas
bibliotecas, cumprindo um papel importante da veiculação de uma história do
Pará e da Amazônia. Tal livro pode ser inserido na categoria de livro regional,
que segundo Flávia Caimi, são “impressos que registram a experiência de grupos
que se identificam por fronteiras espaciais e socioculturais.” (CAIMI, 2013, p.
49).
Assim, considerando que História do Pará é uma fonte importante
para o estudo de uma cultura escolar regional, nosso objetivo neste trabalho é
analisar o livro de Benedicto Monteiro, relacionando as experiências do autor
com alguns conteúdos escolhidos para uma história regional.
Benedicto
Monteiro (1924-2008): vida e obra
Benedicto
Vilfredo Monteiro nasceu em 1924, em Alenquer, no Pará. Fez o curso de
Humanidades no Colégio Marista N.S. de Nazaré em Belém e completou os seus
estudos de ginásio no Rio de Janeiro, onde cursou Direito na Universidade do
Brasil. Ainda no Rio de Janeiro, exerceu o jornalismo na imprensa local e
publicou o seu primeiro livro de poesia, intitulado Bandeira Branca, em 1945, prefaciado pelo escritor Dalcídio
Jurandir. (MONTEIRO, s/d)
Bacharelou-se em Ciências Jurídicas e
Sociais, exerceu os cargos de Promotor Público, Juiz de Direito e Secretário de
Estado. Foi eleito Deputado Estadual pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB),
tendo sido cassado em 1964, pelo regime civil-militar instalado. Ficou preso e
incomunicável por vários meses, tendo seus direitos políticos suspensos por
mais de 10 anos. Depois que saiu da prisão, dedicou-se ao exercício da
advocacia agrarista e à literatura, tendo publicado o livro Direito Agrário e Processo Fundiário e
vários livros de poesia e ficção, destacando-se sua tetralogia amazônica
composta por Verde Vagomundo, O Minossauro, A Terceira Margem e Aquele Um. Nos anos 1980, foi deputado
federal pelo Partido do Movimento Democrático
Brasileiro (PMDB). Abandonando
a vida pública, passou a se dedicar exclusivamente às atividades de escritor.
Redigiu seis livros sobre a história do Pará, desde a época pré-colonial até o
período atual, voltados para o ensino fundamental. (CPDOC, s/d).
O
livro História do Pará, publicado
pela Editora Amazônia em 2006, com 264 páginas, foi produzido originalmente em
fascículos encartados pelo jornal O
Liberal no ano de 2001. Segundo o blog
dedicado a Benedicto Monteiro, este livro representa a “síntese da história
paraense, desde os fundamentos da pré-história amazônica à sua contemporaneidade,
sob o ponto de vista econômico, geográfico, social, político e ecológico.”
(MONTEIRO, s/d). Já os editores da obra História
do Pará, Álvaro Jinkings e Paulo Palmieri, afirmam que:
“Esta
obra consegue falar do Pará num momento histórico, porque não dizer, em que os
olhos do mundo falam dos problemas da Amazônia e se voltam para apontar
soluções. Por isso, nós, Amazônidas, paraenses precisamos conhecer a escrita da
nossa história, para não nos tornarmos reféns do nosso futuro e algozes do
nosso passado. Benedicto Monteiro, dessa maneira, ajuda nossa luta,
possibilitando às gerações futuras um encontro com o que somos e, através de
suas práticas, com o que podemos ser.” (JINKINGS; PALMIERI, 2006, p. 3).
Nesse
discurso de valorizar a identidade amazônida, apontar seus problemas e sugerir
soluções, a obra História do Pará
apresenta os seguintes capítulos:
Capítulo
|
Título
|
Páginas
|
I
|
A
inserção do Pará no cenário europeu
|
10-25
|
II
|
Os
estrangeiros no Pará colonial
|
26-44
|
III
|
Inserção
do Pará no cenário nacional
|
45-75
|
IV
|
O
índio e o negro na história social do Pará
|
76-95
|
V
|
Transição
da colônia para o império
|
96-10
|
VI
|
A
Cabanagem
|
109-151
|
VII
|
O
Pará sob a república
|
152-172
|
VIII
|
O
Brasil e o Pará pós 1930
|
173-189
|
IX
|
O
Pará pós 1964
|
190-210
|
X
|
O
Pará no recente contexto brasileiro
|
211-222
|
XI
|
Sociedade
e cultura no Pará
|
223-238
|
XII
|
Os
recursos naturais na história do Pará
|
239-251
|
XIII
|
Problemas
sociais do estado do Pará
|
252-261
|
A
escolha e abordagem desses temas está diretamente relacionada às experiências
de Monteiro, principalmente nos capítulos finais quando trata do contexto mais
recente da história do Pará, na segunda metade do século XX, como veremos a
seguir.
Imagem: Capa de História do Pará, de Benedicto Monteiro
(2006)
(MONTEIRO, 2006).
Acervo pessoal do autor.
Experiências para a
escrita do livro História do Pará
A ideia de escrever um livro sobre a
história do Pará decorre muito da experiência de vida de Benedicto Monteiro.
Essa experiência é relatada pelo próprio Monteiro no Prefácio de História do Pará. O autor afirma que ao
se formar no curso de humanidades no Colégio Marista Nossa Senhora de Nazaré,
em Belém, “infelizmente”, “não sabia nada sobre a nossa história. Mas sabia
tudo sobre a história da França e sobre todos os episódios da Revolução Francesa”
(MONTEIRO, 2006, p. 5), o que revela que teve um ensino de história voltado
para os fatos ocorridos na Europa. Isso era comum, porque, conforme aponta Elza
Nadai, a história ensinada no Brasil, desde a o período do Império tem uma
matriz europeia, tendo como influência os manuais franceses. Essa história
ensinada aos alunos, ainda presente em vários livros e escolas nos dias de
hoje, foi “a História da Europa Ocidental, apresentada como a verdadeira
História da Civilização.” (NADAI, 1992/1993, p. 146).
Benedicto Monteiro
demonstra uma insatisfação maior com o desconhecimento sobre a Cabanagem
(1835-1840), movimento popular ocorrido no Pará durante o período regencial.
Não por acaso, é o conteúdo que tem o maior espaço no livro, com 42 páginas. A
valorização do movimento cabano está relacionada à experiência de vida de
Monteiro. Ao rememorar seu tempo de estudante no colégio Nazaré, Monteiro
afirma que “não sabia nem que tinha havido no Pará um movimento e uma revolução
denominada Cabanagem.” (MONTEIRO, 2006, p. 5). Já mais tarde, como deputado
estadual, esta “ignorância tornava-se maior, pois a revolução da Cabanagem era
historiografada, nos raros livros dos arquivos públicos, como uma revolta de
negros, mestiços e bandidos”. (MONTEIRO, 2006, p. 5). Questionando essas ideias
em relação ao movimento cabano, Monteiro relata:
“Compartilhei
desses falsos conhecimentos na minha juventude, na minha mocidade e até no
período em que exerci os meus dois mandatos de deputado estadual. E, nesse
período, fui ainda mais perturbado pela ignorância da nossa história e da
verdadeira história da Cabanagem, que hoje é considerada como um dos mais
importantes movimentos nativistas e sociais, ocorridos no Brasil.” (MONTEIRO,
2006, p. 5).
Após
ser cassado pela ditadura civil-militar em 1964, Monteiro relata que procurou
“pesquisar sobre a nossa história baseado nos trabalhos do desembargador Hurley
e do escritor Carlos Rocque.” (MONTEIRO, 2006, p. 5). Já em seu mandato como
deputado federal, a partir de 1982, pronunciou vários discursos sobre a
história do Pará, estimulando órgãos educacionais “a publicar livros didáticos
que ensinassem a nossa história aos estudantes das nossas escolas e até das
nossas universidades”, não conseguindo sensibilizar as autoridades responsáveis.
(MONTEIRO, 2006, p. 5). Após essa tentativa “mal-sucedida” de estimular a
produção didática da história regional enquanto político, Monteiro relata:
“Como
tinha me retirado da militância política partidária, me consagrei a pesquisar
nossa história. Percorri as bibliotecas e os arquivos públicos daqui, do Estado
do Rio de Janeiro, de São Paulo e de Lisboa. Li e reli mais de 200 livros
relacionados com os descobrimentos e a história do Pará. E aí, me propus a
escrever esta História do Pará para suprir essa falta de conhecimento.”
(MONTEIRO, 2006, p. 5).
Segundo
a narrativa de Benedicto Monteiro, foi por iniciativa pessoal e pelo desejo
suprir a lacuna do conhecimento regional que resolveu pesquisar a história do
Pará. Percebemos nisso a construção de uma narrativa pelo autor de uma
trajetória que transpareça uma missão que foi perseguida durante toda a sua
vida: a de tornar conhecida a história do Pará. Desde sua época de estudante ao
período que foi cassado pela ditadura, passando pelo seu mandato como deputado
federal até após o fim de sua militância política, todas essas experiências
estiveram relacionadas à obra História do
Pará, que representa a materialização de seu esforço.
História do Pará ou da Amazônia? Monteiro
esclarece assim o recorte espacial da sua narrativa:
“Não é possível escrever a história do Pará
sem se referir à Amazônia. Assim como não é possível escrever a história da
Amazônia sem conhecer a história do Pará. Isto porque até o século XVIII, o
Estado do Pará incluía todo o território amazônico, descoberto e conquistado da
foz do Amazonas até o extremo-oeste, não respeitando a linha imaginária do
Tratado de Tordesilhas.” (MONTEIRO, 2006, p. 10).
Percebe-se na explicação de Monteiro que a
história do Pará se confunde com a história da Amazônia, pelo menos até o
século XVIII. A justificativa para isso se baseia sobretudo na questão
territorial.
A
reforma agrária como solução para os problemas do Pará
Devido às limitações de formatação
estabelecidas pelas normas para os trabalhos deste Simpósio, vamos nos
restringir a analisar os conteúdos referentes ao período da ditadura
civil-militar e ao final do século XX, principalmente nas questões relacionadas
à reforma agrária, nas quais Monteiro dialoga com as suas vivências.
Benedicto
Monteiro faz várias abordagens em relação à questão ambiental no Pará. A
natureza está presente em praticamente todos os capítulos do livro, além de um
capítulo específico sobre ela, intitulado “Os recursos naturais na história do
Pará”. Em seu prefácio, Monteiro se refere à Amazônia como a região que “ainda
guarda, com enorme sacrifício, a maior bacia hidrográfica do mundo, a maior
reserva de água doce, a maior floresta tropical, com a maior biodiversidade do planeta.”
(MONTEIRO, 2006, p. 6).
Devemos
aqui relacionar com as experiências políticas de Benedicto Monteiro,
especialmente no início dos anos 1960, às vésperas do golpe civil-militar de
1964. Suas preocupações em relação à Amazônia estavam voltadas sobretudo para o
projeto de reforma agrária.
Monteiro foi
secretário de Obras, Terras e Aviação do governo do Pará, durante o mandato do
governador Aurélio do Carmo (1961-1964). Apesar de oficialmente pertencer ao
PTB, Monteiro era ligado ao Partido Comunista Brasileiro (PCB), que estava na
ilegalidade desde 1947. Segundo Edilza Fontes, como membro do PCB, Monteiro
defendia a reforma agrária, já que a temática do campo foi inserida nas
preocupações do partido desde o final dos anos 1940. (FONTES, 2015, p. 382).
O projeto de
reforma agrária de Monteiro tinha como prioridade a redistribuição de terra dos
latifundiários para o pequeno agricultor sem-terra, ou seja, o confisco da
terra. Para ele, há a contradição entre o latifúndio e o campesinato, a
sociedade socialista e sua conquista orientavam a luta pela reforma agrária.
(FONTES, 2015, p. 382).
Edilza Fontes
sintetiza as ideias de Benedicto Monteiro sobre a reforma agrária da seguinte
forma:
“Benedito Monteiro
é um homem do seu tempo, entende que os problemas da concentração de terras, os
latifúndios e as relações sociais que eles estabelecem são problemas históricos
e podem ser resolvidas por meio de ações políticas como a reforma agrária. Ele
nomina o homem do campo como trabalhador rural, camponês, pequeno proprietário,
migrante sem recursos, que poderiam receber terras e desenvolver uma economia
produtiva, progressiva e coletivizada. Um homem do campo capaz de mudar o local
de moradia e trabalho. Um homem do campo produtivo. Organiza-se em cooperativas
e associações. A reforma agrária eliminaria o latifúndio e suas relações de
dominação.” (FONTES, 2015, p. 383).
Benedicto Monteiro
fez um projeto de reforma agrária enquanto deputado estadual, o qual criava o
Instituto de Reforma Agrária do Pará e disciplinava o aproveitamento de terras
públicas do Estado. O projeto deu entrada em 1º de maio de 1962, contudo, não
foi avaliado pela Assembléia Legislativa do Estado do Pará. (FONTES, 2015, p. 382).
O golpe civil-militar de 1964 encerrou as expectativas de uma efetivação do
projeto.
Dessa forma,
podemos questionar: como essas experiências, tanto no Partido Comunista, quanto
na secretaria de obras e no mandato de deputado estadual, se refletem na produção
de Benedicto Monteiro, mais especificamente em História do Pará? Refletem principalmente nos valores que Benedicto
Monteiro atribui à ocupação e aos usos dos recursos naturais da Amazônia,
bastante presentes no livro. As vivências de Monteiro na política e em cargos
públicos no Pará inspira o autor a realizar constantes comparações entre o
passado e o presente na sua obra, tendo como foco a questão da reforma agrária.
Vamos citar algumas.
O capítulo “O Pará
pós 1964”, ao tratar dos conflitos agrários, traz algumas informações sobre a
atuação de Monteiro em relação à reforma agrária quando ocupava o cargo de
secretário de Obras e Terras. Monteiro teria obtido do governador em 1961
alguns decretos que reservavam as margens das estradas federais Belém-Brasília
e Pará-Maranhão “para a instalação de um plano piloto objetivando a reforma
agrária e a instalação de colônias agrícolas para pequenos produtores. Por este
motivo, até 1964, nessas áreas foram distribuídos milhares de títulos de posse
e de títulos coloniais.” Entretanto, tal ação não teve continuidade pelos governos
sucessores, provocando um povoamento desordenado. (MONTEIRO, 2006, p. 204).
A visão de Monteiro
sobre como deveria ter sido feita a reforma agrária influencia na sua abordagem
do tema. O autor considera que o problema da reforma agrária continua até o presente,
pois o que se tem feito no Estado do Pará é apenas uma “política de
assentamento que atende aos interesses de proprietários de terras mal
exploradas.” (MONTEIRO, 2006, p. 204).
As críticas de
Monteiro no tema da reforma agrária também possuem relação com a sua oposição à
ditadura civil-militar (1964-1985). Monteiro denuncia as “intervenções
arbitrárias” que o governo do Pará sofreu com o regime ditatorial, por meio de
órgãos como o Instituto Nacional da Colonização e Reforma Agrária (INCRA) e o Grupo
Executivo para as Terras do Araguaia e Tocantins (GETAT), que estabeleceram a
chamada colonização dirigida. Conforme Benedicto Monteiro, essa colonização foi
a verdadeira responsável pelo “indiscriminado e violento desmatamento” que
sofreu a região do sul do Pará, já que, contando com financiamento público,
“foram derrubadas e queimadas imensas florestas com madeiras preciosas como o
mogno e densos castanhais.” (MONTEIRO, 2006, p. 210).
Benedicto Monteiro conclui a História do Pará reforçando mais uma vez
a sua defesa da reforma agrária. Para Monteiro, “o desemprego é, sem dúvida, o
maior problema social do Pará”, sendo que “os problemas da falta de moradia, de
educação e de saúde não deixam de ser consequência da grande falta de emprego.”
(MONTEIRO, 2006, p. 260). A falta de emprego gera conflitos agrários e
violências urbanas nas cidades. O que poderia resolver esses problemas seria
uma verdadeira reforma agrária:
”A falta de terra para trabalhar, o déficit
de moradia, a falta de atendimento na saúde, a falta de vagas para educação, a
falta de uma política sanitária e a falta de segurança que afeta hoje todas as
grandes cidades, é uma consequência de não ter havido uma verdadeira reforma
agrária, pois os assentamentos feitos pelos órgãos criados pelos governos
militares e que estão sendo feitos hoje não afetaram nem afetam os latifúndios,
porque na sua maioria estão sendo feitos em terras públicas.” (MONTEIRO, 2006,
p. 261).
Cabe dizer também, ainda sobre o período da
ditadura, o silêncio do autor sobre a práticas de tortura utilizadas pelos
militares contra seus opositores. Em relação às resistências ao regime,
Monteiro cita, apenas em uma página, a Guerrilha do Araguaia. O silêncio sobre
a tortura talvez se explique pelo fato do autor ter sofrido essa prática na
prisão, o que certamente foi um acontecimento traumático em sua vida,
preferindo então, deixá-lo no esquecimento. Dessa forma, as críticas ao regime
civil-militar são mais direcionadas à forma da apropriação que a União fez das
terras do Pará, contribuindo para o aumento dos conflitos agrários e a
desigualdade social.
Considerações
finais
O caso de Benedicto Monteiro é singular na
produção de um livro regional utilizado nas escolas porque, mais do que narrar
a história do Pará, mais do que selecionar conteúdos que julga serem
importantes para os alunos conhecerem da história regional, o autor intervém
nessa história, apontando problemas e oferecendo soluções. Há um inconformismo
do autor, pois não lhe “deram ouvidos”, não aceitaram a sua proposta de solução
para os problemas do Pará, que é a reforma agrária. Não tendo a proposta
aceita, Monteiro recorre à produção de um livro para que os jovens tomem
conhecimento de suas tentativas e levem à frente o projeto de concretização da
reforma agrária. Dessa forma, não podemos entender o livro sem dialogarmos com
as experiências de seu autor.
Referências
Geraldo Magella de Menezes Neto é Professor
da graduação e da pós-graduação em História da Faculdade Integrada Brasil
Amazônia (FIBRA), e do ensino fundamental da Secretaria Municipal de Educação
de Belém (SEMEC). Atualmente é Doutorando em História Social da Amazônia pela
Universidade Federal do Pará (UFPA). E-mail: geraldoneto53@hotmail.com
Sites
Blog Benedicto Monteiro. s/d. Disponível em: http://benedictomonteiro.blogspot.com.br/p/benedicto-monteiro.html Acesso em 08 mar. 2019.
Centro de Pesquisa e Documentação de
História Contemporânea do Brasil (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV),
verbete “Benedito Vilfredo Monteiro”. s/d. Disponível em: http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-biografico/benedito-vilfredo-monteiro Acesso em 08 mar. 2019.
Bibliografia
CAIMI, Flávia. O que sabemos (e o que não
sabemos) sobre o livro didático de História: estado do conhecimento, tendências
e perspectivas. In: GALZERANI, Maria Carolina Bovério; BUENO, João Batista
Gonçalves; PINTO JÚNIOR, Arnaldo. (orgs.). Paisagens
da pesquisa contemporânea sobre o livro didático de História. Jundiaí-SP:
Paco Editorial; Campinas-SP: Centro de Memória/ Unicamp, 2013.
FONTES, Edilza Joana. A reforma agrária em
projeto: o uso do espaço legal para garantir o acesso a terra no Pará
(1960-1962). Antíteses. vol. 8, n.
15 esp., p. 366-392, nov. 2015.
JINKINGS, Álvaro; PALMIERI, Paulo.
Apresentação. In: MONTEIRO, Benedicto. História
do Pará. Belém: Editora Amazônia, 2006.
MARTINS, Marcos Lobato. História Regional.
In: PINSKY, Carla Bassanezi. (org.). Novos temas nas aulas de História.
2 ed. São Paulo: Contexto, 2010.
MONTEIRO, Benedicto. História do Pará. Belém: Editora Amazônia, 2006.
NADAI, Elza. O ensino de História no Brasil:
trajetória e perspectiva. Revista
Brasileira de História. São Paulo, v. 13, n. 25/26, set. 1992/ago. 1993.
TEIXEIRA JÚNIOR, Tiese. Ditos e escritos
sobre os Estudos Amazônicos, no Ensino Básico, do Estado do Pará. Bilros, Fortaleza, v. 4, n. 7, p.
13-24, jul.- dez. 2016.
Congratulações professor Geraldo Magella pela pesquisa riquíssima e, na colaboracao deste material científico produzido.
ResponderExcluirPergunta:o autor Benedicto Monteiro em 2006 em seu livro História do Pará, já fazia críticas a reforma agrária e ao desemprego no estado. Neste sentido, o que pode ser utilizado como material didático em sala de aula nos dias de hoje, aproveitando os reflexos históricos encontrados no livro de Benedicto, através de sua pesquisa?
José Guilherme Aguiar Assis
Obrigado Guilherme pela pergunta.
ExcluirApesar de Benedicto Monteiro ter uma visão de História narrativa de grandes acontecimentos, penso que algumas partes do livro podem ser utilizadas ainda hoje de forma crítica. O posicionamento político e a perseguição a qual o autor foi alvo no período da Ditadura militar pode ser tomado como ponto de partida para uma reflexão acerca dos efeitos da ditadura no Pará, a exemplo dos grandes projetos para a Amazônia, que afetaram bastante a população local.
Geraldo Magella de Menezes Neto.
Olá, grande Mestre Geraldo Magella, fico feliz de estar publicando no mesmo evento que você, isso mostra sua competência e o importante papel que assumistes na minha jornada como pesquisador.
ResponderExcluirSobre Benedicto Monteiro, é curioso ler análises sobre esse autor, pois o seu manual intitulado "História do Pará" ainda é utilizado em muitas escolas, inclusive, é referência na escolha de professores ao selecionar materiais para "História da Amazônia" na disciplina "Estudos Amazônicos", portanto, como o livro foi publicado em 2006, a questão agrária é bem importante, mas na sua visão, além da lacuna sobre ditadura militar o senhor identificou mais ausências? Quais lhe chamaram mais atenção além daquela citada?
Cordialmente,
Vinícius Machado Ferreira
Belém-Pa
Olá Vinicius, obrigado pela pergunta.
ExcluirCreio que as principais ausências se referem ao estudo da diversidade indígena e negra na história do Pará, que são vistas pelo autor ainda sob o ponto de vista europeu. O livro carece também de uma análise crítica das fontes, que são utilizadas quase que em sua totalidade como forma de ilustração.
Geraldo Magella de Menezes Neto.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirOlá Geraldo, como a história do Pará é apresentada nas obras didáticas do Plano Nacional do Livro Didático PNLD e quais os eventuais problemas para a história regional?
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